INTERCONEXIÓN ENTRE EMPATÍA EN LA ATENCIÓN DE LA SALUD Y LOS DERECHOS DE LOS PACIENTES


INTERFACE BETWEEN EMPATHY IN HEALTHCARE AND THE PATIENT’S RIGHTS


INTERFACE ENTRE EMPATIA NOS CUIDADOS EM SAÚDE E OS DIREITOS DOS PACIENTES


Aline Albuquerque*


Recibido: 27/04/2021 Aprobado: 28/05/2021


Resumen

Este estudio, que se caracteriza por ser una investiga- ción teórica, tiene como objetivo desarrollar aportes teó- ricos que apoyen las interconexiones entre la empatía en la atención de la salud y los derechos de los pacientes, en- tendidos como los derechos que tienen todas las personas cuando se encuentran bajo la atención de salud. Se sabe que, en vista del paternalismo médico histórico y el alejamiento del paciente del centro asistencial, una ley de derechos del paciente no es fácil de implementar. Por tanto, se concluye en este artículo que el movimiento en torno a la empatía es un aliado en la implementación de los derechos de los pacientes, ya que ambos combinan supuestos básicos, como la esencialidad de las interacciones sociales y la percepción del otro como persona con un valor único, que da lugar a mandatos morales de respeto y trato digno.

Palabras clave: Empatía; Paciente; Derechos; Bioética


Abstract

This study, which is characterized as a theoretical research, aims to develop theoretical contributions that supporttheinterconnectionsbetweenempathyinhealthcare and the rights of patients, understood as the rights that all people have when they are under healthcare. It is known that, in view of the historical medical paternalism and the removal of the patient from the care centre, a patient law


is not easy to implement. Therefore, I conclude that the movement around empathy is an ally in the fulfilment of patients’ rights, as both share basic premises, such as the essentiality of social interactions and the perception of the other as a person with unique value, that gives rise to moral commands of respect and dignified treatment.

Key words: Empathy; Patient; Rights; Bioethics


Resumo

Este estudo, que se caracteriza como uma pesquisa teórica, objetiva desenvolver aportes que sustentem as interconexões entre a empatia nos cuidados em saúde e os direitos dos pacientes, entendidos como os que todas as pessoas têm quando se encontram sob cuidados em saúde. Sabe-se que, em face do histórico paternalismo médico e alijamento do paciente do centro do cuidado, uma lei de direito do paciente não é de fácil implantação. Para tanto, conclui-se neste artigo que o movimento em torno da empatia é um aliado na efetivação dos direitos dos pacientes, pois ambos conjugam premissas basilares, como a essencialidade das interações sociais e a percepção do outro como uma pessoa detentora de valor único, que enseja comandos morais de respeito e tratamento digno.

Palavras chave: Empatia; Paciente; Direitos; Bioética


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* Es investigadora visitante en el Instituto Bonavero de Derechos Humanos de la Universidad de Oxford. Tiene un posdoctorado por la Universidad de Essex. Es: profesora de Bioética en la Universidad de Brasilia, Abogada de la Unión, directora del Instituto Brasilero de Derecho del Paciente, coordina- dora general del Observatorio de Derechos de los Pacientes del Programa de posgrado en Bioética de la UnB.

Correo electrónico: alineaoliveira@hotmail.com

INTRODUÇÃO


Inúmeros problemas globais que ameaçam a preservação da espécie humana e dos demais seres vivos, assim como a existência de condições de vida digna para todos, se entrelaçam com a concepção de empatia. Isto é, a empatia pode ser um fator propulsor de uma nova cultura alicerçada na ideia de “outrospecção” (Krznaric 2015). Se o século XX foi a era da introspecção, na qual a se promoveu o bem-estar individual a partir de uma ótica do auto- empreendorismo, da indústria da autoajuda e do reducionismo dos problemas coletivos às escolhas pessoais, em contraposição, no século XXI o foco está no outro, tal como propõe Krznaric (2015) ao formular a ideia de “outrospecção”. Nessa, o enfrentamento dos problemas coletivos e individuais não passa pela aplicação de uma lógica gerencial e mercadológica, mas sim, pelo reconhecimento de que o fortalecimento dos laços sociais e das interações humanas é essencial para se lidar com os desafios da atualidade.


Em tal perspectiva, a empatia desempenha um lugar central na construção de uma nova sociedade baseada em vínculos de solidariedade. Isso não significa que a empatia seja um remédio para todos os males, mas sim que se trata deum componente central no enfrentamento de problemas contemporâneos, inclusive, como se verá neste artigo, daqueles que dizem respeito aos sistemas de saúde e arelação profissional e paciente. Particularmente, na esfera da saúde, há que se destacar que a pandemia da COVID-19 fez emergir a necessidade dos sistemas de saúde de endossar a empatia, de modo que se conjugue as evidências científicas e o humanismo no cuidado dos pacientes com COVID-19 (Barello Graffigna 2020).


A empatia na esfera dos cuidados em saúde tem-se tornado um tema corrente na literatura no campo da Medicina e da Enfermagem. Além do aumento do número de pesquisas sobre empatia (Azevedo Mota e Mettreau 2018), um dos resultados concretos da empatia estar ganhando espaço nas discussões da área da saúde é o reconhecimento da importância do desenvolvimento da capacidade empática dos profissionais (Patel et al 2019). Essas atividades têm

buscado discutir traços da ação humana, que marcam o reconhecimento empático em relação ao sofrimento do outro em estudantes e profissionais de saúde (Howick 2018). Outro resultado são os relatórios produzidos no âmbito dos serviços de saúde, nos quais registra-se a preocupação com o déficit de empatia nos cuidados em saúde, como “Dying Without Dignity”, relatório do Serviço de Ombudsman da Saúde do National Health Service, e o relatório “One Chance to Get it Right” (Jeffrey 2016).


O reconhecimento da empatia como uma capacidade humana essencial para o desenvolvimento da relação terapêutica (Eby 2018) expressa um movimento na Medicina e em outras áreas da saúde na direção de alterar o paradigma corrente, que se caracteriza por:

(a) o profissional é valorizado como um dispensador de exames e tratamentos; (b) às necessidades, vontade e preferências do paciente não édado opeso dasevidências científi as; (c) o tempo de consulta é encurtado; (d) o paciente é visto como recipiente passivo do cuidado (Howick e Rees 2017). Esse paradigma vigente da Medicina é objeto de críticas, em razão de não situar no centro do encontro clínico a relação humana travada entre o profissional de saúde e o paciente, bem como por priorizar a técnica em detrimento da conexão humana inerente a tal encontro. Esse movimento se associa a uma nova visão acerca do papel do paciente nos cuidados em saúde, o que iniciou a ser delineado tão somente na segunda metade do século XX. Isso se dá com a emergência da centralidade do paciente, enquanto componente da qualidade do cuidado, conforme o notório Relatório de 2001 (The Institute of Medicine 2001) do, então, Instituto de Medicina, bem como da consolidação paulatina do Modelo da Mutualidade ou da Participação Mútua, proposto por Szasz e Hollender (1956). Ainda, mudança signifi ativa que impulsionou o Direito do Paciente diz respeito ao reconhecimento na década de 1970 do paciente como titular de direitos (Annas 2004), e à adoção de legislações de direito do paciente, sendo a primeira adotada na Finlândia, a “Lei sobre o status e os direitos dos pacientes na área da saúde”, que entrou em vigor em 1993 (Leino-Kilpi Kurittu 1995).

Como se nota, a ênfase dada à empatia nos cuidados em saúde se conjuga com o reconhecimento da centralidade do paciente e da essencialidade da sua relação com o profissional de saúde, para melhores resultados. Esse movimento se acopla à proposição de uma Medicina baseada na Empatia (Howick e Rees 2017), que pode ser demarcada a partir dos seguintes eixos: (a) o centro da consulta é a relação humana; (b) a comunicação empática é considerada como uma intervenção efetiva por si só; (c) a consulta empática é central para uma prática baseada em evidências; (d) as necessidades, vontade e preferências do paciente são alçadas a parte do processo de tomada de decisão. Desse modo, este artigo parte do pressuposto de que a empatia nos cuidados em saúde envolve entendimento por parte do profissional de saúde do estado mental e físico do paciente e ação terapêutica na direção de melhor resultado para o paciente (Howick 2019). Assim, essa proposta mostra como essencial dar voz ao paciente e reconhecê-lo como um sujeito de direitos, e a obrigação de respeitar esse entendimento recai sobre todos os profissionais de saúde.


Desse modo, a empatia pode ser propulsora de processos de identificação (Hunt 2009) e de comportamentos pró-sociais, bem como pode pavimentar a racionalidade moral (Decety 2010), que concorrem para a observância dos direitos dos pacientes na prática clínica. Ademais, ressalte-se que a empatia tem a potencialidade de alterar a olhar do profissional de saúde em relação ao paciente (Schultz 2013), que passa a percebê-lo como um semelhante merecedor de respeito e consideração (Dworkin 1989). Nessa linha, Adams (2018) aponta que a empatia é um imperativo ético no encontro clínico, na medida em que traz em seu conteúdo a consideração pela perspectiva do paciente, elemento essencial da tomada de decisões nos cuidados em saúde. Em vista desse percurso, este estudo objetiva desenvolver aportes teóricos que sustentem as interconexões entre

a empatia nos cuidados em saúde e os direitos dos pacientes, entendidos como os direitos que todas as pessoas têm quando se encontram sob cuidados em saúde (Albuquerque 2020). Assim, se trata de pesquisa teórica, cujo escopo consiste em desenvolver aportes teóricos concernentes a um campo do saber, de modo a consolidá-lo e a permitir sua incidência prática (Adom, Hussein e Adu Agyem 2018).


Quanto ao marco teórico empregado nesta pesquisa, esse se divide em três áreas: empatia clínica, Direito do Paciente e empatia e direitos humanos. Em relação à empatia nos cuidados em saúde, este artigo baseou-se nas investigações formuladas por Riess (2018), Hojat (2016) e Howick (2019). No que tange ao Direito do Paciente, alicerçou-se nas pesquisas de Annas (2004), de Cohen e Ezer (2013) e de Albuquerque (2016, 2020). Por fim, esta pesquisa se fundamentou nos estudos de Hunt (2009), Von Harbou (2013), Sajo (2011), e De Waal (2020), acerca das interconexões entre empatia, moralidade e direitos humanos. Escolheu-se adotar a perspectiva dos estudos sobre empatia e direitos humanos, por se entender que os direitos dos pacientes são efetivamente direitos humanos incidentes na esfera dos cuidados em saúde, como será tratado com maior detalhamento neste artigo.


Cabe registrar que esta pesquisa não envolve revisão da literatura ou pesquisa bibliográfica, porquanto se trata de pesquisa teórica, que pressupõe a aplicação de determinado referencial teórico a um objeto de estudo. O presente artigo se estrutura em quatro partes: a primeira sobre o conceito de empatia clínica; a segunda acerca dos benefícios da empatia clínica para os pacientes e profissionais de saúde; a terceira versa sobre o Direito do Paciente: novo ramo jurídico e a sua implementação; a quarta trata das correlações entre empatia e direitos humanos, e, por fim, a última analisa a interface entre a empatia e o campo dos Direitos do Paciente.


EMPATIA NOS CUIDADOS EM SAÚDE



O termo “empatia” é um vocábulo recente que decorreu de estudos filosóficos do final do século XIX,


notadamente de Robert Vischer, Wilhelm Worringer e Theodor Lipps no campo da estética, de William

James na psicologia e de Vernon Lee na sua interseção entre ambos (Yaseen e Foster 2019). No ano de 1908, Titchener, psicólogo da Universidade de Cornell, cunhou o termo “empatia” como uma tradução da palavra alemã “einfuhlung” (“into-feeling”), empregada por Vischer no processo de sua investigação sobre a natureza dos pensamentos. Assim, a palavra “empatia” nos primórdios do seu uso dizia respeito à experiência interna do significado e apreciação estética (Yaseen y Foster 2019), ou seja, à conexão cinestésica com uma pintura ou escultura (Riess 2018). Em meados do século XX, Carl Rogers desenvolveu concepção singular de empatia na psicoterapia, conferindo-lhe um papel significativo na interação entre terapeuta e paciente ao compreendê-la como um processo cujos componentes centrais são a atitude respeitosa e a escuta não julgadora (Yaseen e Foster 2019).


No que tange ao conceito de empatia, assinala- se que distintas concepções circulam na literatura especializada sobre a temática (Coplan 2014) e que, a despeito das suas distinções, a caracterizam como um “construto multidimensional” (Hirn et al. 2020). Neste estudo, adota-se a demarcação conceitual de Riess (2018), isto é, empatia é uma capacidade dinâmica que permite a compartilhamento de experiências, o sentimento de preocupação, a tomada de perspectiva e a motivação de uma responsividade cuidadosa em relação ao outro. Coplan (2014) traz como elemento importante, para se aprofundar o entendimento da empatia, o seu enquadramento como um processo imaginativo complexo, no qual o observador simula o estado psicológico de outra pessoa enquanto mantem um claro senso de diferenciação. Desse modo, verificam-se o processo imaginativo e o senso de diferenciação como elementos que despontam no entendimento da empatia como uma capacidade. Nesse sentido, Riess (2018) também incorpora a imaginação ao pontuar que a empatia exige mais imaginação, quando comparada com a “sympathy”.


A maior parte dos estudiosos (Schurz et al 2021) do tema da empatia a desdobra em três dimensões: empatia emocional ou afetiva, emocional cognitiva e preocupação empática. Outros autores trazem componentes distintos, como o entendimento experiencial (Coplan 2014) e empatia relacional

(Kirkscey 2018). A empatia emocional consiste na capacidade de sentir o que o outro sente, imaginando o estado afetivo da outra pessoa (Riess 2018), estabelecendo, assim, uma correspondência afetiva entre o estado afetivo do observador com o da outra pessoa, mesmo que varie em grau (Coplan 2014). A empatia cognitiva pressupõe a tomada de perspectiva orientada pelo outro e a auto diferenciação em relação ao outro (Coplan 2014), de modo que com base nessa capacidade se compreenda o estado afetivo, as crenças e o pensamento do outro. A empatia cognitiva se estrutura com base na Teoria da Mente, que consiste na habilidade de se entender o que se passa com a outra pessoa e surge por volta dos quatro ou cinco anos de idade (Riess 2014). A preocupação empática consiste em um movimento na direção do outro com a finalidade de ajudá-lo a partir do entendimento da sua situação e do seu estado emocional. Assim, pode- se afirmar que a empatia envolve uma responsividade em relação ao outro, isto é, abarca o entendimento da situação do outro e a resposta apropriada (Riess 2018).


Retomando a distinção entre empatia e “sympathy”, Hojat (2016) assinala que a segunda envolve maior emoção, sendo caracterizada como um estado emocional da mente, ao passo que a empatia consiste em um atributo intelectual. A autoconsciência é maior na empatia e se reduz na “sympathy”, bem como a empatia implica o entendimento do estado emocional e mental do outro e a “sympathy” sentir o sofrimento do outro, sua dor e emoções, em consequência, a empatia envolve uma convergência entre o entendimento e o estado do outro, ao passo que a “sympathy”, um paralelismo de sentimentos. Decety (2010) diferencia ambos os conceitos partindo da noção de empatia como a capacidade de reconhecer a emoção do outro e a “sympathy”, enquanto o sentimento de preocupação em relação ao bem-estar de outrem. Nota-se na literatura que alguns autores identificam a “sympathy” com o componente afetivo ou emocional da empatia. Essa distinção se mostra importante para o estudo da empatia clínica, como adiante será visto.


A empatia nos cuidados em saúde pode ser compreendida sob a perspectiva de duas abordagens, a da empatia clínica (Halpern 2003) (Bikker, Cotton e Mercer 2018) e a da empatia terapêutica (Howick 2019).

A empatia clínica consiste na capacidade de entender a situação do paciente, sua perspectiva e sentimentos, isso envolve tanto a comunicação desse entendimento, quanto checar a sua acurácia, bem como atuar de acordo com essa compreensão para ajudar o paciente (Bikker Cotton y Mercer 2018). Assim, a empatia clínica é uma forma de interação profissional (Mercer y Reynolds 2002),ou seja, a empatia terapêutica engloba o entendimento interpessoal e a ação cuidadosa. O primeiro elemento implica o entendimento ou a tentativa de se entender, correlacionando-se, assim, com o componente da empatia cognitiva. A ação cuidadosa significa a atuação do profissional, na relação com o paciente, com base no entendimento do tipo e da qualidade da experiência vivenciada pelo paciente (Hojat 2016).


Na esfera dos cuidados em saúde, estimula-se, em geral, o componente cognitivo da empatia, em detrimento da empatia emocional, o que acarreta um dissenso sobre a concepção de empatia a ser adotada na esfera dos cuidados em saúde (Jeffrey 2016). Há autores que restringem a empatia ao seu componente cognitivo, isso em razão de se ter em conta que se o profissional de saúde experienciar sentimentos semelhantes aos dos pacientes, há o incremento do risco de burnout e stress (Howick 2019). Nesse sentido, Hojat (2016) sublinha que sentir o grau de sofrimento e dor do paciente

afasta da noção de empatia e se passa a ter a incidência da “sympathy”. Por outro lado, Halpern (2010) advoga que a visão de que a empatia seria o entendimento cognitivo da condição do paciente acarretaria um distanciamento do profissional de saúde. Jeffrey (2016) sublinha que a discordância sobre a empatia emocional e o distanciamento está no cento das discussões sobre a “humanização” doscuidados em saúde. Para além desse dissenso no campo da empatia nos cuidados em saúde, Howick (2019) pontua que, estudos atuais, demonstram a dicotomia simplificadora das dimensões emocionais e cognitivas da empatia, e assevera que em certa medida há sempre o componente emocional e o cognitivo na capacidade empática. No mesmo sentido, De Waal (2020) assinala que a empatia envolve necessariamente o contágio emocional e a avaliação da situação do outro, seu componente cognitivo.


Em suma, empatia nos cuidados em saúde envolve o entendimento do que a doença significa para o paciente; a comunicação pelo profissional de saúde desse entendimento e a verificação da sua acurácia; a atuação do profissional de saúde com base em tal entendimento, de modo terapêutico e prestativo (Howick 2019). A empatia nos cuidados em saúde abarca uma série de benefícios para todos os atores do encontro clínico, conforme apontamos a continuação.


BENEFÍCIOS DA EMPATIA NOS CUIDADOS EM SAÚDE PARA OS PACIENTES E PROFISSIONAIS DE SAÚDE


As conexões humanas podem promover a saúde e prevenir as enfermidades. Pesquisas epidemiológicas, desde 1979, demonstram que, a ausência de conexões humanas, estão significativamente vinculadas a doenças e à mortalidade. Inúmeros estudos (Hojat 2016) indicam que o risco de adoecer dobra, no mínimo, quando uma das conexões sociais se torna frágil. Assim, as conexões sociais são protetivas e podem ser enquadradas como um determinante social da saúde. Nessa linha, o isolamento social é um fator de risco significativo para mortalidade e morbidade, tal como obesidade, sedentarismo e tabagismo. Em consequência, a conexão empática entre profissionais

e pacientes consiste em um tipo específico de suporte social com todos os seus benefícios e dificuldades (Hojat 2016). Sendo assim, a empatia na relação entre o profissional de saúde e o paciente potencializa a conexão humana essencial para o bem-estar de ambos.


A literatura especializada sobre empatia nos cuidados em saúde apresenta desde as suas primeiras publicações, como a de Mercer e Reynolds (2002), os benefícios da empatia para pacientes, profissionais de saúde e os sistemas de saúde (Bas-Sarmiento et al. 2020). Atualmente, verificam-se estudos numerosos de saúde (Kerasidou Horn 2018), que evidenciam os

efeitos benéficos da empatia para os resultados do paciente, sendo considerada um elemento central da provisão de cuidados em saúde.


Mercer e Reynolds (2002) assinalam que pacientes quando levados a definir qualidade dos cuidados primários a empatia emerge como um fator-chave. No que tange aos benefícios para os pacientes, podem ser identificados: (a) aumento da satisfação do paciente (Bas-Sarmiento et al. 2020); (b) acurácia do diagnóstico (Mercer Reynolds 2002); (c) maior aderência terapêutica (Bas-Sarmiento et al. 2020); (d) redução da depressão e da ansiedade do paciente e o aumento da sua qualidade de vida (Patel et al 2019);

(e) melhora da confiança do paciente no profissional de saúde e, por consequência, a revelação de aspectos íntimos da sua vida (Halpern 2003) (Hirsch 2007).


No que tange aos benefícios para os profissionais de saúde (Bas-Sarmiento et al 2020), destacam-se: (a) aumento do bem-estar da equipe de saúde; (b) redução do burnout e do seu surgimento; (c) redução de comportamentos agressivos e conflitos de trabalho; (d) aumento da capacidade de liderança; (e) diminuição da litigância contra os profissionais de saúde; (f) os

profissionais que se encontram mais afinados com as necessidades sociais dos seus pacientes experienciam menos burnout (Hirsch 2007).


Constata-se que há variados estudos que demonstram a importância da empatia para melhores resultados em saúde, seja do ponto de vista psicológico ou farmacológico (Mercer Reynolds 2002).


Por outro lado, quanto aos impactos negativos da empatia, assinala-se que a empatia emocional pode acarretar estresse do profissional de saúde e sua fadiga empática, por isso precisa estar acoplada à autorregulação (Riess 2018). Desse modo, o autocuidado, a autoempatia e a autoconsciência são essenciais para os profissionais de saúde reduzirem a fadiga e se manterem aptos a estabelecerem conexões empáticas com os pacientes (Moudatsou et al. 2020).


Uma vez descritos os benefícios consolidados na literatura sobre a empatia e os cuidados em saúde, considerando o objeto deste artigo, no item em sequência tem-se como escopo discorrer de forma sintética acerca do Direito do Paciente, entendido como um novo ramo da esfera jurídica.


DIREITO DO PACIENTE: NOVO RAMO JURÍDICO



O direito do paciente é aqui entendido como uma disciplina jurídica dogmática (Ferraz Júnior 2003) e, portanto, consiste em um campo do saber que se dedica “a questões jurídicas no contexto e com base em um ordenamento jurídico determinado, historicamente constituído” (Larenz 1997, 1). Situa- se, assim, ao lado de outras disciplinas que se ocupam de temáticas relacionadas à saúde, tais como o direito médico, o biodireito e o direito sanitário. Considera-se o direito do paciente como uma disciplina dogmática do direito em razão de se constituir sobre a base de certas premissas ou pontos fixos de referência, a partir dos quais se demarcam “comportamentos juridicamente possíveis” (Ferraz Júnior 2003, 48), com o objetivo de “criar condições para a decidibilidade de conflitos juridicamente definidos” (Ferraz Júnior 2003, 48). Desse modo, o direito do paciente tem por objeto


as normas sobre a relação entre profissional de saúde, paciente e familiares no contexto dos cuidados em saúde, que atribuem aos pacientes prescrições legais que os autorizam a pretender garantidamente algo.


Com efeito, o Direito dopaciente parte de três premissas centrais: ocuidado centrado no paciente, o modelo da mutualidade da relação entre profissional de saúde e paciente e o reconhecimento do paciente como sujeito de direito. Quanto ao primeiro pressuposto, a abordagem do cuidado centrado no paciente consiste em uma parceria entre profissionais, pacientes e seus familiares com vistas a assegurar que as decisões respeitem as vontades, as necessidades e as preferências dos pacientes, e que estes sejam informados e apoiados em suas necessidades de tomar decisões e de participar do seu próprio cuidado (The Institute of

Medicine 2001). Quanto aos modelos de relação entre profissional de saúde, o Modelo da Mutualidade se alicerça na relação de parceria entre o profissional e o paciente e elege a tomada de decisão compartilhada como o modo de decidir mais adequado à efetivação da autonomia pessoal do paciente (Albuquerque 2020). Em relação ao último pressuposto do direito do paciente, esse diz respeito ao entendimento de que ser paciente é uma condição humana específica, que em razão da sua vulnerabilidade acrescida, quando comparada com uma pessoa sadia, foi, historicamente, submetida ao poderio médico, marca da assimetria de poder caracterizadora do encontro clínico.


O direito do paciente tem como foco de estudo os direitos dos pacientes que decorrem da aplicação dos direitos humanos ao contexto dos cuidados em saúde (Albuquerque 2016) (European Commission 2016) (Cohen Ezer 2013). Com efeito, os direitos humanos constituem prescrições ético-jurídicas construídas com base em consensos advindos da comunidade internacional, extraídos da expansão do círculo da moralidade (De Waal 2020) – passando da lealdade e do dever para com a família e o clã para a comunidade, a nação, a humanidade e todas as formas de vida –, delimitando-se como uma ética mínima universal.

Com base no reconhecimento da dignidade intrínseca do paciente e, no respeito à sua autodeterminação e integridade corporal, cabe aos Estados adotar leis de direitos dos pacientes, transpondo-os para o ordenamento jurídico nacional. Assim, os direitos dos pacientes, contidos nas leis dos países, são expressão dos direitos humanos que assentam um mínimo ético nos cuidados em saúde, balizadores da relação entre profissional de saúde e paciente e provê uma linguagem que empodera e engaja os pacientes no processo terapêutico (Putturaj et al. 2020).


Com efeito, a prestação de cuidados em saúde há que ser feita em conformidade com as evidências científicas e os direitos humanos (Püras 2017). A assimetria de poder nos sistemas de saúde conduziu, historicamente, a violações de direitos dos pacientes. Em decorrência, o arcabouço normativo dos direitos dos pacientes resulta do reconhecimento de que os direitos humanos se “aplicam indiretamente aos cuidados em saúde por meio da responsabilidade estatal de regular os profissionais de saúde a sua prática” (Erdman 2017), o que é feito mediante os direitos dos pacientes. Os direitos dos pacientes, portanto, derivam dos direitos humanos previstos em tratados, conforme o quadro abaixo explicita (Albuquerque 2020):



Quadro 1: Direitos do paciente derivados do Direito Internacional dos Direitos Humanos

Direito humano do paciente

Direito do paciente

Direito à vida

Direito a cuidados em saúde de qualidade e seguro.

Direito à privacidade

Direito à autodeterminação–direito a recusar tratamentos e procedimentos; direito ao consentimento informado; direito a participar do processo de tomada de decisão; e direito à segunda opinião.

Direito à confidencialidade de dados pessoais.

Direito de não ser discriminado

Direito de não ser discriminado no momento do atendimento e da prestação do serviço de saúde.

Direito à informação

Direito à informação sobre sua condição de saúde; direito de acesso ao prontuário;

Direito à saúde

Direito aos cuidados gerais em saúde com qualidade e segurança.

Direito aos remédios efetivos

Direito de apresentar uma queixa e direito à reparação.

O direito do paciente se entrelaça com a empatia nos cuidados em saúde no que tange à sua origem histórica e a outros pontos de contato que serão objeto deste artigo. Historicamente, apregoou-se na formação dos médicos de que poderiam compreender os sentimentos dos pacientes e, simultaneamente, manter o distanciamento emocional, entendido, até a década de 1960, como supressão de respostas emocionais. A partir de tal momento, pacientes, enfermeiros e clérigos começaram a questionar a atitude dos médicos em relação aos pacientes (Halpern 2014). Na década de 1970, o movimento dos direitos dos pacientes alterou a paisagem dos cuidados em saúde e da relação entre profissional e paciente (Annas 2004). Esse movimento, em convergência com os movimentos no campo da Bioética, questionou o paternalismo médico e a falta de compaixão, nos cuidados em saúde. Contexto no qual exemplos de desumanização tornaram-se notórios, o que conduziu os pacientes a colocarem em xeque a

adequação do distanciamento entre profissionais de saúde e a demandarem maior empatia por parte dos primeiros (Halpern 2014). Desse modo, o surgimento dos direitos dos pacientes tem como pano de fundo a mesma ambiência que fez surgiu os reclamos por empatia nos cuidados em saúde. Igualmente, compartilham o deslocamento do paciente do papel de objeto da intervenção médica para o de sujeito de uma relação humana que deve ser pautada pela empatia e respeito.


Sustentar que o direito do paciente é um novo ramo jurídico, que parte da premissa de que o encontro clínico se sustenta na comunicação empática e na capacidade empática do profissional de saúde, tem como desiderato contribuir para a implementação dos direitos dos pacientes no cotidiano dos cuidados em saúde, que será objeto da parte subsequente deste artigo.


CORRELAÇÕES ENTRE EMPATIA, DIREITOS HUMANOS E MORALIDADE



As pesquisas sobre o papel da empatia nos direitos humanos ainda são escassas, assim, este artigo se alicerça nos estudos de Hunt (2009), Von Harbou (2013), Sajó (2011), acerca das interconexões entre empatia e direitos humanos e moralidade e empatia, formulados por De Waal (2020).


Segundo Hoffman (2014), há fartas evidências de que a maior parte das pessoas quando se deparam com situações de estresse que envolvem o outro, tendem a ressoar o stress e a motivar-se a ajudar. Assim, os seres humanos têm uma tendência natural na direção do apoio ao próximoem situações difíceis, cuja justificativa se ampara na seleção natural.


Com efeito, entre as forças da seleção natural incidentes sobre os seres humanos destacam as tendências de cooperação e de mutualidade. Tal concepção se contrapõe à visão de que a seleção natural seja um “processo cruel e impiedoso de eliminação”, que privilegia os seres mais hostis, essa visão equivocada é denominada por De Waal (2020, 85) de “erro de Beethoven”.


A importância dos sentimentos e intuições no campo moral reflete uma longa tradição na Filosofia Moral, cujos teóricos centrais são David Hume, Adam Smith e Arthur Schopenhauer (Von Harbou 2013). O denominado “sentimentalismo de Hume”, ao longo dos últimos anos, tem sido amparado na ciência empírica e há um crescente entendimento de que o julgamento moral tem bases intuitivas e emocionais (Von Harbou 2013). Como exemplo de tal entendimento, De Waal (2020) estabelece três níveis de moralidade, sendo que os níveis superiores inexistem sem os inferiores:

  1. sentimentos morais, que abarcam a capacidade empática, a tendência à reciprocidade, senso de justiça e a habilidade para estabelecer relações harmônicas;

  2. pressão social, que diz respeito ao estímulo ao comportamento cooperativo, por meio de mecanismos de constrangimento e punição; (c) julgamentos e raciocínios, que envolvem a internalização das necessidades e dos propósitos dos outros no julgamento moral.


    A moralidade é um fenômeno, em sua origem, intragrupo, que se expandiu para a ênfase no

    bem-comum, deslocando-se das relações interpessoais para preocupações em torno da manutenção da sociedade. A empatia tem o condão de pavimentar a racionalidade moral (Decety Cowell 2014) na construção de consensos morais e jurídicos universais, ao habilitar que se sinta a dor e o prazer do outro, ampliando o círculo de moralidade (Cumper Lewis 2018).


    Com efeito, a empatia tem sido considerada um motivador da inclinação de ajuda na direção do outro (Schultz 2014) e de movimentos sociais que propiciam alterações nas legislações e na correlação de poder que se dá em determinadas interações sociais. A empatia cognitiva, notadamente por meio da tomada de perspectiva, contribui para o enfrentamento dos estigmas e dos processos discriminatórios de certos grupos populacionais. Nesse sentido, tomar a perspectiva de uma pessoa com deficiência física que seja cadeirante acarreta modos de percepção da sua condição de vida, percepção essa que pode ser generalizada, concorrendo para mudanças sociais (Decety, Cowell 2014).


    Assim, a empatia permite que uma pessoa se desloque de sua visão e sentimento como centro e consiga imaginar e “entender a cultura, crenças, interesses, emoções, desejos e necessidades de outro” (Kitayama Hashizaki 2018, 274). Há eventos históricos que ilustram a influência da empatia nos julgamentos morais e na justiça (Cumper Lewis 2018), como o fato de que emoções como culpa e sentimento de injustiça motivaram alemães no período nazista a salvar judeus; o movimento de direitos civis nos Estados Unidos na década de 1960; a luta pela abolição da escravatura no século XIX (Sajo 2011). Nessa linha, Hunt (2009), ao abordar a história dos direitos humanos, traça um paralelo entre os avanços em tal campo e a empatia forjada pela literatura, que permitiu sentimentos de ultraje em relação a violações de direitos humanos, modelando a racionalidade moral.


    Por meio da capacidade empática, os seres humanos conseguem entender o outro, o que não pressupõe se colocar em seu lugar, mas sim a imaginação da condição do outro e a criação de um processo de

    identificação (Schultz 2014). Assim, a empatia se revela a essência para os comportamentos pró-sociais, ao facilitar a cooperação e impulsionar a formalização de exigências éticas em direitos humanos, formalmente estabelecidos em normas jurídicas, notadamente por meio da identificação com a vítima de dor, em decorrência de práticas objeto da norma jurídica (Sajó 2011).


    Quanto aos contextos de violação de direitos humanos, a falta de empatia pode conduzir à desumanização de pessoas e grupos ao eclipsar a ideia de que todas os humanos detêm valor intrínseco, ideal que consubstancia a “dignidade humana” (Schultz 2014). Desse modo, os julgamentos morais no campo dos direitos humanos implicam uma motivação empática que se direciona ao bem-estar do outro (Von Harbou 2013).


    Portanto, a habilidade dos seres humanos de tomar a perspectiva do outro, ao compreender sua condição particular de vida e suas emoções, propicia a defesa de direitos que asseguram ao outro a melhora de tal condição e a mitigação do seu sofrimento. A efetivação de direitos humanos de determinados grupos populacionais ou atinentes a certos temas, como o de não ser submetido a tratamento desumano e degradante, é impulsionada pela ampliação do círculo de moralidade, gerada pela empatia. Reconhece-se que a empatia é, prioritariamente, uma capacidade expressada intragrupo, porém, verifica-se no progresso civilizatório dahumanidade a expansão da empatia para estranhos, o que se verifica de forma explícita no caso dos direitos dos refugiados e apátridas. Cabe assinalar, por fim, que, conforme pontua Von Harbour (2013), a empatia é um elemento essencial para a previsão em normas de direitos humanos de exigências éticas, porém, não é suficiente, haja vista que diversos outros fatores impactam em tal processo de formalização. O mesmo se aplica para a importância da empatia no respeito aos direitos humanos.


    Dessa forma, a empatia é nodal para a consolidação do direito do paciente e a promoção dos seus direitos, na prática diária dos cuidados em saúde, objeto do seguinte ponto abordado.

    INTERFACE ENTRE EMPATIA E DIREITOS DOS PACIENTES


    O Direito do Paciente tem como objeto leis de direitos dos pacientes que, em geral, abarca os seguintes direitos: direito a cuidados em saúde de qualidade e seguros; direito a recusar tratamentos e procedimentos; direito ao consentimento informado; direito a participar do processo de tomada de decisão; direito à segunda opinião; direito à confidencialidade de dados pessoais; direito de não ser discriminado; direito à informação sobre sua condição de saúde; direito de acesso ao prontuário e direito de apresentar uma queixa e direito à reparação. A lei de direito do paciente, que fixa os direitos assinalados, tem, dentre várias funções, a de legitimar o pleito dos pacientes, sendo denominada por Goodman e Jinks (2013) de “função expressiva da lei”. Tal função, além da apontada, se desdobra nas seguintes: (a) sinaliza valores e consensos morais pactuados; (b) localiza determinadas condutas no campo do reprovável; (c) confere visibilidade ao tema objeto da lei, provocando discussão, realização de pesquisas acadêmica e de campanhas e conscientização da população sobre práticas violadoras de direitos, mas consolidadas; (d) provoca mudança de comportamentos, notadamente em pessoas que tenham temor de sanções.


    Tratando-se da lei de direito do paciente, essa lei é essencial para: (a) conscientizar os pacientes sobre os próprios direitos e legitimar tal pleito; (b) provocar mudanças no comportamento de profissionais de saúde que se regem eticamente, pelo temor da punição;

  3. conferir visibilidade ao tema em toda a sociedade;

  4. alterar a formação dos profissionais de saúde, na medida em que a lei passa a constar dos programas dos Cursos de Graduação; (e) explicitar para os profissionais de saúde e do Direito as condutas que são reprováveis ética e juridicamente nos cuidados em saúde; (f) compele os hospitais e demais serviços de saúde a adotar políticas institucionais específicas sobre direitos dos pacientes. Considerando tal quadro, busca-se, em seguida, desenvolver aportes teóricos que sustentem as interconexões entre a empatia nos cuidados em saúde e os direitos dos pacientes, particularmente, quanto à função da lei de provocar mudanças comportamentais,

de concepção dos profissionais de saúde e de legitimar os pleitos dos pacientes.


A relevância conferida à empatia nos cuidados em saúde expressa uma mudança do paradigma do que se entende como “distanciamento emocional” e como “objetividade” na relação profissional–elementos que compõem o entendimento da expressão do “profissionalismo puro” -, para o paradigma da centralidade da relação terapêutica – profissional e paciente–nos cuidados em saúde.


A nossa capacidade de ser empático é dinâmica e permite o compartilhamento de experiências, se sentir afetado, adotar a perspectiva do outro e motivar uma resposta cuidadosa (Riess 2018). Ainda, a empatia pressupõe a compreensão não julgadora da experiência do outro (Hojat 2016) e a provisão de melhor cuidado em saúde, na medida em que os profissionais passam a considerar as preocupações do paciente (Kerasidou Horn 2018). Essas preocupações são materializadas em direitos, os quais expressam a forma pelo qual o paciente deseja ser tratado. Quando o profissional de saúde atua de forma empática, percebe o paciente como um semelhante e pode reconhecê-lo como um sujeito autônomo de direitos.


No que tange aos direitos dos pacientes, em particular, destaca-se a empatia terapêutica, que abarca a comunicação com o paciente e o entendimento mais acurado do que a doença signifi a para o paciente (Howick et al 2018). Esse aspecto é essencial para o exercício do direito a participar do processo de tomada de decisão e o direito a cuidado em saúde de qualidade e seguro. Isso em razão da empatia ser considerada uma dimensão da Tomada de Decisão Compartilhada (Kirkscey 2018), que pressupõe o exercício de escuta empática por parte do profissional de saúde e a valoração das necessidades, vontade e preferências do paciente (Howick Rees 2017). A elaboração de um plano de cuidado e a adoção de intervenções personalizadas também são reforçadas pela relação empática entre profissional e paciente (Moudatsou et al 2020).

No que toca à qualidade e à segurança do cuidado, a empatia terapêutica concorre para o incremento da qualidade nos cuidados em saúde (Moudatsou et al 2020). Com efeito, contribui, ademais, para maior acurácia no diagnóstico, consequentemente, menor risco de erro de diagnóstico, bem como para se alcançar melhores resultados, quando se adiciona empatia à consulta clínica. Estudo realizado sobre pacientes com diabetes demonstrou a associação entre a empatia e o curso terapêutico positivo da doença, e outro apontou os pacientes com câncer apresentam menos estresse e depressão quando seu tratamento foi empático (Moudatsou et al 2020). Em relação ao mesmo direito, o manejo da dor é um elemento da qualidade do cuidado, e a empatia do profissional com a dor do paciente pode ser um fator significativo na provisão de medicamentos opioides e outras estratégias sem o uso desses remédios.


Quanto ao direito ao consentimento informado, esse consiste no processo no qual o paciente e o profissional de saúde se engajam em um diálogo sobre o tratamento/procedimento proposto, consequências, riscos, benefícios e alternativas. O paciente assina um documento que atesta seu engajamento no diálogo. Caso tenha sido criada uma relação empática entre o paciente e o profissional, a comunicação entre ambos é facilitada, para tanto, é indispensável que o paciente tenha tempo para relatar a sua história e se sentir realmente escutado (Bikker, Cotton e Mercer 2014). Desse modo, o direito ao consentimento informado é efetivamente exercido pelo paciente, pois o mero fornecimento de um termo padronizado sem o engajamento do paciente e a criação de um espaço de escuta genuíno, que abarque as dúvidas sobre o procedimento ou o tratamento, não atendem ao conteúdo do direito assinalado.


O paciente tem o direito de recusar tratamentos e procedimentos, o que significa assentar o comando de que um paciente adulto e capaz tem o direito de recusar tratamento e procedimento por qualquer motivação. A empatia nos cuidados em saúde pressupõe o interesse e a preocupação do profissional pelas crenças, valores, necessidades e preferências, e o entendimento de que respeitar o paciente como pessoa implica aceitar sua decisão de recusa de tratamentos e procedimentos,

mesmo quando o profissional discorda. O julgamento moralizante (Rosenberg 2015) do paciente, por parte do profissional que avalia a sua recusa, etiqueta e estigmatiza o paciente a partir dos critérios de moralidade do profissional, e acaba por bloquear a sua empatia e a tomada de perspectiva sob a ótica do outro. Nesse caso, o exercício da empatia por parte do profissional o ajudará a entender a escolha do paciente pela recusa e, por consequência, respeitar o seu direito.


Odireitodenãoserdiscriminadosignificaqueosdireitos do paciente devem ser exercidos sem discriminação de qualquer tipo, baseada em fatores pessoais. A empatia no encontro clínico implica reconhecer o paciente como uma pessoa e que, a despeito da visão de mundo do profissional ser crítica quanto a determinado fator pessoal do paciente, o exercício da sua capacidade empática permite a conexão entre ambos. Desse modo, nesse caso, a capacitação de profissionais de saúde em empatia e em comunicação empática seria importante para evitar atitudes discriminatórias nos cuidados em saúde.


O direito à informação sobre sua condição de saúde envolve o processo comunicacional entre o profissional e o paciente. Consiste, então, no direito de ser informado sobre o seu estado de saúde, sobre o tratamento, as alternativas e os seus respectivos riscos e benefícios, bem como sobre os efeitos do tratamento. As informações sobre o tratamento e as alternativas devem ser explicadas de maneira a serem entendidas pelo paciente e cabe ao profissional checar se o paciente efetivamente compreendeu o que lhe foi transmitido. Igualmente, a falta de empatia e de conexão com o estado emocional do paciente pode fazer com que o profissional de saúde forneça informação em excesso, contribuindo para piorar o seu quadro ou dificultando o seu entendimento acerca das informações necessárias para a sua tomada de decisão.


Por fim, quanto ao direito à segunda opinião, a empatia do profissional de saúde e o seu entendimento dos medos e inseguranças do paciente se revelam importantes para que apoiem o paciente na busca pela opinião de outro profissional de saúde. De todo o abordado em linhas anteriores nesse artigo, se inferem as seguintes conclusões sobre este estudo.

CONCLUSÕES


A empatia nos cuidados em saúde é reconhecida como um componente da relação entre profissional e paciente, essencial para se alcançar melhores resultados em saúde, maior satisfação do paciente e do profissional. Essa importância que se dá à empatia na atualidade revela o adoecimento de um sistema baseado no poder decisional absoluto do médico, na centralidade da doença, no uso excessivo de medicamentos e tecnologias e na redução do tempo de encontro clínico, dentre outros fatores. Como resposta, há inúmeras propostas que se atrelam à gestão, à economia e a outras esferas da saúde, mas, se pode considerar que a empatia e a sua promoção nos hospitais e outras unidades de saúde também consistem em outro modo de conceber os cuidados em saúde. Esse outro modo se alia aos movimentos dos direitos dos pacientes e da sua centralidade no cuidado, os quais situam a pessoa no

centro dos sistemas de saúde. Particularmente, esses direitos que se expressam em lei específica têm como objetivo último assegurar que o paciente, como uma pessoa única, seja respeitado, sendo visto não como um portador de doença, mas sim um ser com crenças, valores, necessidades e preferências em situação de vulnerabilidade.


Sabe-se que, em face do histórico paternalismo médico e alijamento do paciente do centro do cuidado, uma lei de direito do paciente não é de fácil implantação. Para tanto, sustenta-se neste artigo que o movimento em torno da empatia é um aliado na efetivação dos direitos dos pacientes, pois ambos conjugam premissas basilares, como a essencialidade das interações sociais eapercepção do outro como uma pessoa detentora do arcabouço de direitos provenientes da dignidade humana.

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